domingo, 26 de fevereiro de 2012

"1984" - George Orwell, de 1949


Minha edição é de 1978, comprei em um sebo paulista.


LEITURA DA OBRA

(releitura em andamento...)


“GUERRA É PAZ

LIBERDADE É ESCRAVIDÃO

IGNORÂNCIA É FORÇA”


A leitura da obra de George Orwell, escrita em 1949, pode ser lida e adaptada para os dias atuais simplesmente substituindo-se a personagem principal do totalitarismo, o Partido SOCialista INGlês na ficção - o INGSOC, pelo Partido da Imprensa Golpista mundial – PIG*, atual ferramenta ideológica do sistema capitalista totalitário que atua com dominação total dos veículos de comunicação de massa apagando o passado, deturpando e inventando o presente e destruindo o futuro da liberdade humana.

Aliás, o PIG mundial – O GRANDE IRMÃO - está destruindo a liberdade humana em nome da “liberdade” humana (de alguns)!


“QUEM CONTROLA O PASSADO,

CONTROLA O FUTURO;

QUEM CONTROLA O PRESENTE,

CONTROLA O PASSADO.”



CAPÍTULO 1

“Era um dia frio e ensolarado de abril, e os relógios batiam treze horas. Winston Smith, o queixo fincado no peito numa tentativa de fugir ao vento impiedoso, esgueirou-se rápido pelas portas de vidro da Mansão Vitória; não porém com rapidez suficiente para evitar que o acompanhasse uma onda de pó áspero...”


SEMANA DO ÓDIO (TÃO MODERNO!)

“(...) Fazia parte da campanha de economia, preparatória da Semana do Ódio (...) Em cada patamar, diante da porta do elevador, o cartaz da cara enorme o fitava da parede. Era uma dessas figuras cujos olhos seguem a gente por toda parte. O grande irmão zela por ti, dizia a legenda.”


VIGILÂNCIA ININTERRUPTA (NO SÉCULO XXI É CONSENTIDA)

“(...) O aparelho (chamava-se teletela) podia ter o volume reduzido, mas era impossível desligá-lo de vez...


COMENTÁRIO: hoje, as pessoas não desligam a teletela (facebook e telefones móveis) nem estando no vaso sanitário, nem dormindo ou fazendo sexo.


“(...) Ao nível da rua outro cartaz, rasgado num canto, drapejava ao vento, ora cobrindo ora descobrindo a palavra INGSOC (...) Era a Patrulha da Polícia, espiando pelas janelas do povo. Mas as patrulhas não tinham importância. Só importava a Polícia do Pensamento.”


“O Ministério da Verdade – ou Miniver, em Novilíngua – era completamente diferente de qualquer outro objeto visível. Era uma enorme pirâmide de alvíssimo cimento branco, erguendo-se terraço sobre terraço, trezentos metros sobre o solo. De onde estava Winston conseguiu ler, em letras elegantes colocadas na fachada, os três lemas do Partido:”

“GUERRA É PAZ

LIBERDADE É ESCRAVIDÃO

IGNORÂNCIA É FORÇA”


“Eram quase onze horas e no Departamento de Registro, onde Winston trabalhava, já arrastavam cadeiras dos cubículos e as arrumavam no centro do salão, diante da grande teletela, preparando-se para os Dois Minutos de Ódio...


“(...) Devia ter uns vinte e sete anos, e era de aparência audaciosa, com cabelo negro e espesso, rosto sardento e movimentos rápidos, atléticos. Uma estreita faixa escarlate, emblema da Liga Juvenil Anti-Sexo, dava várias voltas à sua cintura, o suficiente para realçar as curvas das ancas. Winston antipatizara com ela desde o primeiro momento. E sabia porquê. Era por causa da atmosfera de campos de hóquei, chuveiro frio, piqueniques e grande linha moral que conseguia inspirar. Ele antipatizava com todas as mulheres, principalmente com as moças e bonitas. Eram sempre as mulheres, e principalmente as moças, os militantes mais fervorosos do Partido, os devoradores de palavras de ordem, os espiões amadores e os especulas dos desvios...


“Como de hábito, a face de Emmanuel Goldstein, o Inimigo do Povo, surgira na tela. Aqui e ali houve assovios entre o público. A mulherzinha de cabelo cor de areia emitiu um uivo misto de medo e repugnância. Goldstein era o renegado e traidor que um dia, muitos anos atrás (exatamente quantos ninguém se lembrava), fora uma das figuras de proa do Partido, quase no mesmo plano que o próprio Grande Irmão, tendo depois se dedicado a atividades contra-revolucionárias, sendo por isso condenado à morte, da qual escapara, desaparecendo misteriosamente. O programa dos Dois Minutos de Ódio variava de dia a dia, sem que porém Goldstein deixasse de ser o personagem central cotidiano. Era o traidor original, o primeiro a conspurcar a pureza do Partido...”


NA TELA DA SESSÃO DOS DOIS MINUTOS DE ÓDIO...

“(...) Goldstein lançava o costumeiro ataque peçonhento às doutrinas do Partido – um ataque tão exagerado e perverso que uma criança poderia refutá-lo (...) Insultava o Grande Irmão, denunciava a ditadura do Partido, exigia a imediata conclusão da paz com a Eurásia, advogava a liberdade de palavra, a liberdade de imprensa, a liberdade de reunião, a liberdade de pensamento, gritava histericamente que a revolução fora traída...”


“(...) ver ou mesmo pensar em Goldstein produzia automaticamente medo e raiva. Era o objeto de ódio mais constante que a Eurásia ou a Lestásia porquanto, quando a Oceania estava em guerra com uma dessas potências, em geral estava em paz com a outra. O estranho, todavia, é que embora Goldstein fosse odiado e desprezado por todo mundo, embora todos os dias, e milhares de vezes por dia, nas tribunas, teletelas, jornais, livros, suas teorias fossem refutadas, esmagadas, ridicularizadas, apresentadas aos olhos de todos como lixo à-toa... e apesar de tudo isso, sua influência nunca parecia diminuir (...) Era comandante de um vasto exército de sombras, uma rede subterrânea de conspiradores dedicados à derrocada do Estado. Supunha-se que se chamava a Fraternidade. Murmurava-se também a respeito de um livro terrível, um compêndio de todas as heresias, escrito por Goldstein...”


IMPOSSÍVEL NÃO SE CONTAMINAR COM O ÓDIO

“(...) O horrível dos Dois Minutos de Ódio era que embora ninguém fosse obrigado a participar, era impossível deixar de se reunir aos outros. Em trinta segundos deixava de ser preciso fingir. Parecia percorrer todo o grupo, como uma corrente elétrica, um horrível êxtase de medo e vindita, um desejo de matar, de torturar, de amassar rostos com um malho, transformando o indivíduo, contra a sua vontade, num lunático a uivar e fazer caretas...”


CRIMIDÉIA

“(...) A Polícia do Pensamento o apanharia do mesmo modo. Cometera – e teria cometido, nem que não levasse a pena ao papel – o crime essencial, que em si continha todos os outros. Crimidéia, chamava-se. O crimidéia não era coisa que pudesse ocultar...


SER VAPORIZADO


“(...) As pessoas simplesmente desapareciam, sempre durante a noite. O nome do cidadão era removido dos registros, suprimida toda menção dele, negada sua existência anterior, e depois esquecido. Era-se abolido, aniquilado, vaporizado era o termo corriqueiro.”




CAPÍTULO 2

“Quando pôs a mão no trinco viu que deixara o diário aberto na mesa. ABAIXO O GRANDE IRMÃO lia-se em toda a página, em letras quase visíveis da porta, de tão grandes. Cometera um erro incrivelmente estúpido. Percebeu, entretanto, que mesmo no seu pânico não quisera sujar o belo papel creme fechando o caderno sobre a tinta fresca”


“Era a sra. Parsons, esposa de um vizinho do mesmo andar. (“Sra. era termo um tanto antipatizado pelo Partido – o correto era chamar todo mundo de ‘camarada’ – mas com certas mulheres era usado instintivamente.) Teria uns trinta anos, mas parecia muito mais velha. Dava a impressão de ter poeira nas rugas.”


IDEOCRIMINOSOS

“- És um traidor! – berrou o menino. – És um ideocriminiso! És um espião eurasiano!. Eu te mato, te vaporizo, te mando para as minas de sal!”


ENFORCAMENTOS ERAM ESPETÁCULOS POPULARES

“Deviam ser enforcados aquela noite, no Parque, uns prisioneiros eurasianos, criminosos de guerra. Isso acontecia uma vez por mês e era um grande espetáculo popular. As crianças sempre exigiam que as levassem.”


HERÓIS INFANTIS QUE DENUNCIAM OS PAIS

“Era quase normal que as pessoas de mais de trinta tivessem medo aos próprios filhos. E com fartos motivos, pois rara era a semana em que o Times não publicasse um tópico contando como um pequeno salafrário – ‘herói infantil’ era a expressão usada – ouvira alguma observação comprometedora e denunciara os pais à Polícia do Pensamento”


O DIÁRIO SECRETO DE WINSTON

“(...) Ele voltou à mesa, molhou a pena e escreveu:

Ao futuro ou ao passado, a uma época em que o pensamento seja livre, em que os homens sejam diferentes uns dos outros e que não vivam sós – a uma época em que a verdade existir e o que foi feito não puder ser desfeito:
Cumprimento da era da uniformidade, da era da solidão, da era do Grande Irmão, da era do duplipensar!

Ele já estava morto, refletiu. Pareceu-lhe que só agora, depois de começar a formular suas ideias, dera o passo decisivo. As consequências de cada ato são incluídas no próprio ato. Escreveu:
          
          Crimidéia não acarreta a morte: crimidéia É a morte.



CAPÍTULO 3

“Winston sonhava com sua mãe. Devia ter uns dez ou onze anos quando sua mãe desaparecera. Era alta, estatuesca, meio calada, de movimentos vagarosos e magnífico cabelo claro. Do pai lembrava-se mais vagamente. Era moreno e magro, vestia sempre roupas escuras, bem postas (Winston lembrava-se vivamente das solas finas dos sapatos do pai), e usava óculos. Os dois deviam, evidentemente, ter sido tragados num dos grandes expurgos de 1950-60.”


“QUEM CONTROLA O PASSADO,

CONTROLA O FUTURO;

QUEM CONTROLA O PRESENTE,

CONTROLA O PASSADO.”


“O Partido dizia que a Oceania jamais fora aliada da Eurásia, Ele, Winston Smith, sabia que a Oceania fora aliada da Eurásia não havia senão quatro anos. Onde, porém, existia esse conhecimento? Apenas em sua consciência, o que em todo caso devia ser logo aniquilado. E se todos os outros aceitassem a mentira imposta pelo Partido – se todos os anais dissessem a mesma coisa – então a mentira se transformava em história, em verdade. ‘Quem controla o passado’, dizia o lema do Partido, ‘controla o futuro; quem controla o presente, controla o passado’. E no entanto o passado, conquanto de natureza alterável, nunca fora alterado. O que agora era verdade era verdade do sempre ao sempre. Era bem simples. Bastava apenas uma série infinda de vitórias sobre a memória. ‘Controle da realidade’, chamava-se. Ou, em novilíngua, ‘duplipensar’.”


O CONTROLE DA REALIDADE

“Winston deixou cair os braços e lentamente tornou a encher os pulmões de ar. Seu espírito mergulhou no mundo labiríntico do duplipensar. Saber e não saber, ter consciência de completa veracidade ao exprimir mentiras  cuidadosamente arquitetadas, defender simultaneamente duas opiniões opostas, sabendo-as contraditórias e ainda assim acreditando em ambas; usar a lógica contra a lógica, repudiar a moralidade em nome da moralidade, crer na impossibilidade da democracia e que o Partido era o guardião da democracia; esquecer tudo quanto fosse necessário esquecer, trazê-lo à memória prontamente no momento preciso, e depois torná-lo a esquecer; e acima de tudo, aplicar o próprio processo ao processo. Essa era a sutileza derradeira: induzir conscientemente a inconsciência, e então, tornar-se inconsciente do ato de hipnose que se acabava de realizar. Até para compreender a palavra ‘duplipensar’ era necessário usar o duplipensar.”


CAPÍTULO 4

BURACOS DA MEMÓRIA

Qualquer papel ou documento encontrado pelo chão ou os exemplares utilizados no departamento de registro para refazer o passado escrito em jornais, revistas, livros ou em qualquer outra forma de registro documental deveriam ser incinerados nos buracos da memória.

“Dia a dia e quase minuto a minuto o passado era atualizado (...) Toda a história era um palimpsesto...”

“(...) e daí a mentira selecionada passaria aos anais permanentes, tornando-se verdade”


EXPURGOS HUMANOS

“(...) labutava dia após dia, não fazendo outra coisa senão procurar e suprimir da imprensa os nomes de pessoas vaporizadas, e portanto consideradas inexistentes”

“Os grandes expurgos, envolvendo milhares de pessoas, com julgamentos públicos (...) não ocorriam senão de dois em dois anos. O mais comum era as pessoas caídas na antipatia do Partido sumirem simplesmente, e nunca mais se ouvir falar delas”


COMUNICAÇÃO DE MASSAS PARA ENTORPECER PROLETARIADO

“Neles (departamentos especializados) eram produzidos jornalecos ordinários que continham pouca coisa mais que notícias de esporte, polícia e astrologia, sensacionais noveletas de cinco centavos, filmes transbordando de sexo...”

IMPESSOA – novilíngua para pessoas expurgadas: “já era, não existia, nunca existira”.


CAPÍTULO 5

NOVILÍNGUA

“- É lindo destruir palavras. Naturalmente, o maior desperdício é nos verbos e adjetivos, mas há centenas de substantivos que podem perfeitamente ser eliminados (...) Cada palavra contém em si o contrário. ‘Bom’, por exemplo. Se temos a palavra ‘bom’, para que precisamos de ‘mau’? ‘Imbom’, faz o mesmo efeito...”

“- Não vês que todo o objetivo da Novilíngua é estreitar a gama do pensamento? No fim, tornaremos a crimidéia literalmente impossível, porque não haverá palavras para expressá-la...”

“(...) A revolução se completará quando a língua for perfeita. Novilíngua é Ingsoc e Ingsoc é Novilíngua...”

“Como será possível dizer ‘liberdade é escravidão’, se for abolido o conceito de liberdade? Todo o mecanismo do pensamento será diferente. Com efeito, não haverá pensamento, como hoje o entendemos. Ortodoxia quer dizer não pensar... não precisar pensar. Ortodoxia é inconsciência.”


ORTODOXIA É IGUAL A INGSOC

 “Fosse o que fosse, podia-se ter a certeza de que cada palavra era pura ortodoxia, puro Ingsoc.”


FACECRIME

“Era terrivelmente perigoso deixar os pensamentos vaguearem num lugar público, ou no campo de visão duma teletela. A menor coisa poderia denunciá-lo. Um tique nervoso, um olhar inconsciente de ansiedade, o hábito de falar sozinho – tudo que sugerisse anormalidade, ou algo de oculto.”


CAPÍTULO 6

O SEXO NO MUNDO DE “1984”

“(...) nenhuma mulher do Partido usava perfume, nem se podia imaginar que fizesse tal coisa. Só os proles usavam perfume. Para ele, aquele cheiro trazia à mente o ato sexual”

“Tacitamente, o Partido se inclinava até a incentivar a prostituição, para dar saída a instintos que não podiam ser totalmente suprimidos...”


INSEMART

“O objetivo do Partido não era simplesmente impedir que homens e mulheres criassem lealdades difíceis de controlar. Seu propósito real, não declarado, era roubar todo o prazer ao ato sexual...”

“Todos os casamentos entre membros do Partido tinham de ser aprovados por um comitê nomeado para esse fim...”

“Todas as crianças deveriam nascer por inseminação artificial (insemart) e educadas em instituições públicas...”


(outras postagens virão sobre a sequência da obra...)

Bibliografia:
ORWELL, George. 1984. Companhia Editora Nacional, tradução de Wilson Velloso, 1978. 11ª edição. 


Post Scriptum:

Em 10/9/13, compartilhei essa postagem no Facebook com o seguinte comentário:

"LITERATURA E POLÍTICA: Olá amig@s, eu gosto muito de ler e resenhar e ou destacar trechos de obras em meu blog de cultura. Dá um trabalhão, mas é minha maneira de contribuir na rede mundial com o conceito WIKI - What I Know Is (o que eu sei é...)
Essa obra de Orwell critica o totalitarismo. O tema é sempre atual e importante. Serve para questionar regimes à direita e à esquerda. Abraços e boa leitura aos que encararem o post."

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

O Leviatã, introdução - Thomas Hobbes (I)


Capa original de 1651.
Fonte: Wikipedia


Texto publicado em 1651 na Inglaterra


LEITURA

A ideia geral do livro de Hobbes está exposta na introdução. É bem interessante.

Como esse é um clássico que pouca gente leu, pensei em colocar o trecho abaixo para se ter uma ideia do que o autor discorrerá na obra.

Já li alguns capítulos do livro. Provavelmente, como quase tudo que leio, não passarei de algumas páginas. Mas a ideia do Leviatã está exposta abaixo.


INTRODUÇÃO

“Do mesmo modo que tantas outras coisas, a natureza (a arte mediante a qual Deus fez e governa o mundo) é imitada pela arte dos homens também nisto: que lhe é possível fazer um animal artificial. Pois vendo que a vida não é mais do que um movimento dos membros, cujo início ocorre em alguma parte principal interna, por que não poderíamos dizer que todos os autômatos (máquinas que se movem a si mesmas por meio de molas, tal como um relógio) possuem uma vida artificial? Pois o que é o coração, senão uma mola; e os nervos, senão outras tantas cordas; e as juntas, senão outras tantas rodas, imprimindo movimento ao corpo inteiro, tal como foi projetado pelo Artífice? E a arte vai mais longe ainda, imitando aquela criatura racional, a mais excelente obra da natureza, o Homem. Porque pela arte é criado aquele grande Leviatã a que se chama Estado, ou Cidade (em latim Civitas), que não é senão um homem artificial, embora de maior estatura e força do que o homem natural, para cuja proteção e defesa foi projetado. E no qual a soberania é uma alma artificial, pois dá vida e movimento ao corpo inteiro; os magistrados e outros funcionários judiciais ou executivos, juntas artificiais; a recompensa e o castigo (pelos quais, ligados ao trono da soberania, todas as juntas e membros são levados a cumprir seu dever) são os nervos, que fazem o mesmo no corpo natural; a riqueza e prosperidade de todos os membros individuais são a força; Salus Populi (a segurança do povo) é seu objetivo; os conselheiros, através dos quais todas as coisas que necessita saber lhe são sugeridas, são a memória; a justiça e as leis, uma razão e uma vontade artificiais; a concórdia é a saúde; a sedição é a doença; e a guerra civil é a morte. Por último, os pactos e convenções mediante os quais as partes deste Corpo Político foram criadas, reunidas e unificadas assemelham-se àquele Fiat, ao Façamos o homem proferido por Deus na Criação.

Para descrever a natureza deste homem artificial, examinarei:

Primeiro, sua matéria, e seu artífice; ambos os quais são o homem.

Segundo, como, e através de que convenções é feito; quais são os direitos e o justo poder ou autoridade de um soberano; e o que o preserva e o desagrega.

Terceiro, o que é um Estado Cristão.

Quarto, o que é o Reino das Trevas.

(...)”


Bibliografia:

HOBBES DE MALMESBURY, Thomas. Leviatã ou Matéria, Forma e Poder de um Estado Eclesiástico e Civil. Tradução de João Paulo Monteiro e Maria Beatriz Nizza da Silva. Coleção Os Pensadores. Nova Cultural, edição 1999.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Crónica de una muerte anunciada - Gabriel García Márquez


Capa da edição que li.

Crónica de una muerte anunciada – Gabriel García Márquez


CLÁSSICO COLOMBIANO de 1981


Li este livro de García Márquez em 2005. Reli agora.

“El día en que lo iban a matar, Santiago Nasar se levantó a las 5.30 de la mañana para esperar el buque en que llegaba el obispo. Había soñado que atravesaba un bosque de higuerones donde caía una llovizna tierna, y por un instante fue feliz en el sueño, pero al despertar se sintió por completo salpicado de cagada de pájaros. ‘Siempre soñaba con árboles’, me dijo Plácida Linero, su madre, evocando 27 años después los pormenores de aquel lunes ingrato. ‘La semana anterior había soñado que iba solo en un avión de papel de estaño que volaba sin tropezar por entre los almendros’, me dijo. Tenía una reputación muy bien ganada de intérprete certera de los sueños ajenos, siempre que se los contaran en ayunas, pero no había advertido ningún augurio aciago en esos dos sueños de su hijo, ni en los otros sueños con árboles que él le había contado en las mañanas que precedieran a su muerte” (Fortes traços iniciais na obra de G. G. Márquez)


Antes da leitura desta obra curta, porém de forte impacto, havia lido o mais clássico dos clássicos do autor – Cem anos de solidão, de 1967.

Assim como sempre me chamou a atenção o nome de sua maior história, pois me remete a uma solidão imensa, dolorosa e profunda – e que sempre senti -, “Crônica de uma morte anunciada” também tem um nome muito chamativo.

Quantos de nós não vemos situações que, no fundo, já sabemos que o final será a morte ou evento catastrófico?

Por exemplo, quanto tempo fiquei esperando por aquele telefonema que recebi dizendo que meu pai havia sofrido um infarto? Tudo na crônica de sua vida indicava aquilo. Tudo!

Agora mesmo, a crônica da sobrevida de meu pai, e a crônica da vida cotidiana daquela casa onde meus pais vivem é algo anunciado.


Fui estudante de letras e terminei o bacharelado. Apesar disso, a crônica de minha vida torta levou-me a outros destinos que não fossem viver e apreciar o mundo das letras. Os acasos não me levaram a viver e me sustentar em função das letras.

Como leitor amador, partilho com os leitores do blog minha impressão sobre a leitura desta crônica funérea de Santiago Nasar.

O LIVRO É MUITO BOM!

A história

O narrador-personagem volta a sua cidade natal, muitos anos depois do assassinato de Santiago Nasar, para buscar informações e tentar reconstituir o crime que marcou sua infância, pois ele narrador era membro daquela comunidade que presenciou evento tão bárbaro. Mais que isso, havia relação de amizade entre a vítima e as pessoas de seu relacionamento.

Os personagens da comunidade se conhecem. Uns são meio aparentados dos outros. É fácil visualizar isso para aqueles que cresceram ou já viveram em cidades pequenas ou de interior.

Onde cresci, em Uberlândia, nos anos oitenta, vi assassinatos a facadas assim. Esses crimes de armas brancas eram comuns. É horrível a cena deste tipo de crime!

Pelo que pude averiguar, a história se trata de caso verídico ocorrido na comunidade onde viveu Gabriel García Márquez.

A técnica narrativa

O mais fascinante na obra é a forma como García Márquez reconstitui o assassinato, buscando entender e deixando pistas de que as casualidades foram determinantes para que efetivamente Santiago Nasar fosse morto pelos irmãos Vicario.

Para os estudantes de letras, com tempo e foco no estudo literário, sugiro a leitura tranquila e crítica, que permita avaliar a técnica do tempo narrativo e do formato pouco comum de história que começa do fim para o começo.

Não é qualquer escritor que alcança o objetivo de cativar o leitor já dizendo de cara o desfecho da história e, dali, começar a voltar passo a passo até finalizar no evento que já sabemos.

Essa técnica de García Márquez é demais. Alguém se lembra de como começa a saga secular da família Buendía em “Cem anos de solidão”?

“Muchos años después, frente al pelotón de fusilamiento, el coronel Aureliano Buendía había de recordar aquella tarde remota en que su padre lo llevó a conocer el hielo…”

É isso!

Ler é uma das melhores aptidões do ser humano. É pena que seja a minoria no mundo que tenha o hábito deste prazer.


Bibliografia:

MÁRQUEZ, Gabriel García. Crónica de una muerte anunciada. DeBolsillo, 7ª edición. Editorial Sudamericana S.A. Buenos Aires, 2005.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

El hombre de la multitud - Edgar Alan Poe


El hombre de la multitud (1840)

Cuentos de Edgar Allan Poe

Tradução do inglês ao espanhol: Julio Cortázar

CONTOS HISPANO-AMERICANOS DO SÉCULO XX
FLM0275 - FFLCH/USP (2002)

Este foi um dos textos que vimos na matéria dentro da primeira série de textos sobre os contos e suas técnicas e características. Como não tenho muitas anotações das aulas, anexo aqui o que encontrei na Wikipédia, pois sou defensor da enciclopédia livre e achei satisfatório o que está descrito.

Argumento (Wikipedia)
El relato se inicia con la siguiente cita del moralista francés Jean de la Bruyère: "Ce grand malheur, de ne pouvoir être seul", tomada de su obra Caractères. Dicha cita puede traducirse: «Qué gran desgracia la de no poder estar solo.» La misma cita puede encontrarse en el primer cuento de Poe: Metzengerstein.1
Tras superar una enfermedad no definida, el narrador pasa el tiempo en un café londinense. Fascinado por la multitud que observa pasar a través de la ventana, considera los distintos tipos y personajes (nobles, amanuenses, comerciantes, abogados...), y el aislamiento a que están sometidos, a pesar de vivir apiñados en la gran ciudad. Al caer la tarde, el narrador se fija en «a decrepit old man, some sixty-five or seventy years of age» ("un anciano decrépito de unos sesenta y cinco o setenta años"). Era «de escasa estatura, flaco y aparentemente muy débil. Vestía ropas tan sucias como harapientas». El narrador, lleno de curiosidad, decide dejar el café y seguir a este hombre. Éste conduce al narrador por tiendas y comercios, sin comprar nunca nada, hasta acabar en una zona muy pobre de la ciudad, para regresar otra vez al corazón de la misma. La persecución se prolonga a lo largo de toda la noche y todo el día siguiente. Finalmente, exhausto, el narrador se enfrenta cara a cara al extraño anciano, quien, sin darse cuenta de haber sido seguido, pasa de largo. El narrador sospecha, al verle perderse de nuevo entre la multitud, que debe de ser un terrible criminal, llamándolo el hombre de la multitud.


El hombre de la multitud (1840)

Ce grand malheur de ne pouvoir être seul. (La Bruyère)

Qué gran desgracia la de no poder estar solo” (Wikipedia)

Bien se ha dicho de cierto libro alemán que “er lässt sich nicht lesen” -no se deja leer-. Hay ciertos secretos que no se dejan expresar. Hay hombres que mueren de noche en sus lechos, estrechando convulsivamente las manos de espectrales confesores, mirándolos lastimosamente en los ojos; mueren con el corazón desesperado y apretada la garganta a causa de esos misterios que no permiten que se los revele. Una y otra vez, ¡ay!, la conciencia del hombre soporta una carga tan pesada de horror que sólo puede arrojarla a la tumba. Y así la esencia de todo crimen queda inexpresada.


No hace mucho tiempo, en un atardecer de otoño, hallábame sentado junto a la gran ventana que sirve de mirador al café D..., en Londres. Después de varios meses de enfermedad, me sentía convaleciente y con el retorno de mis fuerzas, notaba esa agradable disposición que es el reverso exacto del “ennui”; disposición llena de apetencia, en la que se desvanecen los vapores de la visión interior - άχλϋς ή πριν έπήεν - y el intelecto electrizado sobrepasa su nivel cotidiano, así como la vívida aunque ingenua razón de Leibniz sobrepasa la alocada y endeble retórica(1) de Gorgias. El solo hecho de respirar era un goce, e incluso de muchas fuentes legítimas del dolor extraía yo un placer. Sentía un interés sereno, pero inquisitivo, hacia todo lo que me rodeaba. Con un cigarro en los labios y un periódico en las rodillas, me había entretenido gran parte de la tarde, ya leyendo los anuncios, ya contemplando la variada concurrencia del salón, cuando no mirando hacia la calle a través de los cristales velados por el humo.
(1) retórica frágil


Dicha calle es una de las principales avenidas de la ciudad, y durante todo el día había transitado por ella una densa multitud. Al acercarse la noche, la afluencia aumentó, y cuando se encendieron las lámparas pudo verse una doble y continua corriente de transeúntes pasando presurosos ante la puerta. Nunca me había hallado a esa hora en el café, y el tumultuoso mar de cabezas humanas me llenó de una emoción deliciosamente nueva. Terminé por despreocuparme de lo que ocurría adentro y me absorbí en la contemplación de la escena exterior.


Al principio, mis observaciones tomaron un giro abstracto y general. Miraba a los viandantes en masa y pensaba en ellos desde el punto de vista de su relación colectiva. Pronto, sin embargo, pasé a los detalles, examinando con minucioso interés las innumerables variedades de figuras, vestimentas, apariencias, actitudes, rostros y expresiones.


La gran mayoría de los que iban pasando tenían un aire tan serio como satisfecho, y sólo parecían pensar en la manera de abrirse paso en el apiñamiento. Fruncían las cejas y giraban vivamente los ojos; cuando otros transeúntes los empujaban, no daban ninguna señal de impaciencia, sino que se alisaban la ropa y continuaban presurosos. Otros, también en gran número, se movían incansables, rojos los rostros, hablando y gesticulando consigo mismos como si la densidad de la masa que los rodeaba los hiciera sentirse solos. Cuando hallaban un obstáculo a su paso cesaban bruscamente de mascullar(2) pero redoblaban sus gesticulaciones, esperando con sonrisa forzada y ausente que los demás les abrieran camino. Cuando los empujaban, se deshacían en saludos hacia los responsables, y parecían llenos de confusión. Pero, fuera de lo que he señalado, no se advertía nada distintivo en esas dos clases tan numerosas. Sus ropas pertenecían a la categoría tan agudamente denominada decente. Se trataba fuera de duda de gentileshombres, comerciantes, abogados, traficantes y agiotistas; de los eupátridas(3) y la gente ordinaria de la sociedad; de hombres dueños de su tiempo, y hombres activamente ocupados en sus asuntos personales, que dirigían negocios bajo su responsabilidad. Ninguno de ellos llamó mayormente mi atención.
(2) resmungar       (3) bem nascidos, filhos da elite, aristocracia.


El grupo de los amanuenses(4) era muy evidente, y en él discerní dos notables divisiones. Estaban los empleados menores de las casas ostentosas, jóvenes de ajustadas chaquetas, zapatos relucientes, cabellos con pomada y bocas desdeñosas. Dejando de lado una cierta apostura que, a falta de mejor palabra, cabría denominar oficinesca, el aire de dichas personas me parecía el exacto facsímil de lo que un año o año y medio antes había constituido la perfección del bon ton. Afectaban las maneras ya desechadas por la clase media -y esto, creo, da la mejor definición posible de su clase.
(4) pessoas que copiam com boa caligrafia.


La división formada por los empleados superiores de las firmas sólidas, los «viejos tranquilos», era inconfundible. Se los reconocía por sus chaquetas y pantalones negros o castaños, cortados con vistas a la comodidad; las corbatas y chalecos, blancos; los zapatos, anchos y sólidos, y las polainas o los calcetines, espesos y abrigados. Todos ellos mostraban señales de calvicie, y la oreja derecha, habituada a sostener desde hacía mucho un lapicero, aparecía extrañamente separada (5). Noté que siempre se quitaban o ponían el sombrero con ambas manos y que llevaban relojes con cortas cadenas de oro de maciza y antigua forma. Era la suya la afectación de respetabilidad, si es que puede existir una afectación tan honorable.
(5) descrições impresionantes e detalhadas.


Había aquí y allá numerosos individuos de brillante apariencia, que fácilmente reconocí como pertenecientes a esa especie de carteristas elegantes que infesta todas las grandes ciudades. Miré a dicho personaje con suma detención y me resultó difícil concebir cómo los caballeros podían confundirlos con sus semejantes. Lo exagerado del puño de sus camisas y su aire de excesiva franqueza los traicionaba inmediatamente (6).
(6) o observador diz reconhecer todos os tipos sociais. Mais abaixo, dirá reconhecer os malandros pela cor da pele, olhar vago e perdido, lábios pálidos e apertados.


Los jugadores profesionales -y había no pocos- eran aún más fácilmente reconocibles. Vestían toda clase de trajes, desde el pequeño tahúr de feria, con su chaleco de terciopelo, corbatín de fantasía, cadena dorada y botones de filigrana, hasta el pillo, vestido con escrupulosa y clerical sencillez, que en modo alguno se presta a despertar sospechas. Sin embargo, todos ellos se distinguían por el color terroso y atezado de la piel, la mirada vaga y perdida y los labios pálidos y apretados. Había, además, otros dos rasgos que me permitían identificarlos siempre; un tono reservadamente bajo al conversar, y la extensión más que ordinaria del pulgar, que se abría en ángulo recto con los dedos. Junto a estos tahúres observé muchas veces a hombres vestidos de manera algo diferente, sin dejar de ser pájaros del mismo plumaje. Cabría definirlos como caballeros que viven de su ingenio. Parecen precipitarse sobre el público en dos batallones: el de los dandis y el de los militares. En el primer grupo, los rasgos característicos son los cabellos largos y las sonrisas; en el segundo, los levitones y el aire cejijunto.


Bajando por la escala de lo que da en llamarse superioridad social, encontré temas de especulación más sombríos y profundos. Vi buhoneros judíos, con ojos de halcón brillando en rostros cuyas restantes facciones sólo expresaban abyecta humildad; empedernidos mendigos callejeros profesionales, rechazando con violencia a otros mendigos de mejor estampa, a quienes sólo la desesperación había arrojado a la calle a pedir limosna; débiles y espectrales inválidos, sobre los cuales la muerte apoyaba una firme mano y que avanzaban vacilantes entre la muchedumbre, mirando cada rostro con aire de imploración, como si buscaran un consuelo casual o alguna perdida esperanza; modestas jóvenes que volvían tarde de su penosa labor y se encaminaban a sus fríos hogares, retrayéndose más afligidas que indignadas ante las ojeadas de los rufianes, cuyo contacto directo no les era posible evitar; rameras de toda clase y edad, con la inequívoca belleza en la plenitud de su feminidad, que llevaba a pensar en la estatua de Luciano, por fuera de mármol de Paros y por dentro llena de basura; la horrible leprosa harapienta, en el último grado de la ruina; el vejestorio lleno de arrugas, joyas y cosméticos, que hace un último esfuerzo para salvar la juventud; la niña de formas apenas núbiles, pero a quien una larga costumbre inclina a las horribles coqueterías de su profesión, mientras arde en el devorador deseo de igualarse con sus mayores en el vicio; innumerables e indescriptibles borrachos, algunos harapientos y remendados, tambaleándose, incapaces de articular palabra, amoratado el rostro y opacos los ojos; otros con ropas enteras aunque sucias, el aire provocador pero vacilante, gruesos labios sensuales y rostros rubicundos y abiertos; otros vestidos con trajes que alguna vez fueron buenos y que todavía están cepillados cuidadosamente, hombres que caminan con paso más firme y más vivo que el natural, pero cuyos rostros se ven espantosamente pálidos, los ojos inyectados en sangre, y que mientras avanzan a través de la multitud se toman con dedos temblorosos todos los objetos a su alcance; y, junto a ellos, pasteleros, mozos de cordel, acarreadores de carbón, deshollinadores, organilleros, exhibidores de monos amaestrados, cantores callejeros, los que venden mientras los otros cantan, artesanos desastrados, obreros de todas clases, vencidos por la fatiga, y todo ese conjunto estaba lleno de una ruidosa y desordenada vivacidad, que resonaba discordante en los oídos y creaba en los ojos una sensación dolorosa(7).
(7) não deixa de ser espantoso a capacidade e precisão do observador em descrever tantos grupos e caracteres sociais dos transeuntes, considerando-se que ele se encontra em uma janela de um café e à noite.


A medida que la noche se hacía más profunda, también era más profundo mi interés por la escena; no sólo el aspecto general de la multitud cambiaba materialmente (pues sus rasgos más agradables desaparecían a medida que el sector ordenado de la población se retiraba y los más ásperos se reforzaban con el surgir de todas las especies de infamia arrancadas a sus guaridas por lo avanzado de la hora), sino que los resplandores del gas, débiles al comienzo de la lucha contra el día, ganaban por fin ascendiente y esparcían en derredor una luz agitada y deslumbrante. Todo era negro y, sin embargo, espléndido, como el ébano con el cual fue comparado el estilo de Tertuliano.


Los extraños efectos de la luz me obligaron a examinar individualmente las caras de la gente y, aunque la rapidez con que aquel mundo pasaba delante de la ventana me impedía lanzar más de una ojeada a cada rostro, me pareció que, en mi singular disposición de ánimo, era capaz de leer la historia de muchos años en el breve intervalo de una mirada.


Pegada la frente a los cristales, ocupábame en observar la multitud, cuando de pronto se me hizo visible un rostro (el de un anciano decrépito de unos sesenta y cinco o setenta años) que detuvo y absorbió al punto toda mi atención, a causa de la absoluta singularidad de su expresión. Jamás había visto nada que se pareciese remotamente a esa expresión. Me acuerdo de que, al contemplarla, mi primer pensamiento fue que, si Retzch la hubiera visto, la hubiera preferido a sus propias encarnaciones pictóricas del demonio. Mientras procuraba, en el breve instante de mi observación, analizar el sentido de lo que había experimentado, crecieron confusa y paradójicamente en mi cerebro las ideas de enorme capacidad mental, cautela, penuria, avaricia, frialdad, malicia, sed de sangre, triunfo, alborozo, terror excesivo, y de intensa, suprema desesperación. Me sentí extrañamente excitado, lleno de asombro y fascinación. «¡Qué extraordinaria historia está escrita en ese pecho!», me dije. Nacía en mí un ardiente deseo de no perder de vista a aquel hombre, de saber más sobre él. Poniéndome rápidamente el abrigo y tomando sombrero y bastón, salí a la calle y me abrí paso entre la multitud en la dirección que le había visto tomar, pues ya había desaparecido. Después de algunas dificultades terminé por verlo otra vez; acercándome, lo seguí de cerca, aunque cautelosamente, a fin de no llamar su atención. Tenía ahora una buena oportunidad para examinarlo. Era de escasa estatura, flaco y aparentemente muy débil. Vestía ropas tan sucias como harapientas; pero, cuando la luz de un farol lo alumbraba de lleno, pude advertir que su camisa, aunque sucia, era de excelente tela, y, si mis ojos no se engañaban, a través de un desgarrón del abrigo de segunda mano que lo envolvía apretadamente alcancé a ver el resplandor de un diamante y de un puñal. Estas observaciones enardecieron mi curiosidad y resolví seguir al desconocido a dondequiera que fuese.


Era ya noche cerrada y la espesa niebla húmeda que envolvía la ciudad no tardó en convertirse en copiosa lluvia. El cambio de tiempo produjo un extraño efecto en la multitud, que volvió a agitarse y se cobijó bajo un mundo de paraguas. La ondulación, los empujones y el rumor se hicieron diez veces más intensos. Por mi parte la lluvia no me importaba mucho; en mi organismo se escondía una antigua fiebre para la cual la humedad era un placer peligrosamente voluptuoso. Me puse un pañuelo sobre la boca y seguí andando. Durante media hora el viejo se abrió camino dificultosamente a lo largo de la gran avenida, y yo seguía pegado a él por miedo a perderlo de vista. Como jamás se volvía, no me vio. Entramos al fin en una calle transversal que, aunque muy concurrida, no lo estaba tanto como la que acabábamos de abandonar. Inmediatamente advertí un cambio en su actitud. Caminaba más despacio, de manera menos decidida que antes, y parecía vacilar. Cruzó repetidas veces a un lado y otro de la calle, sin propósito aparente; la multitud era todavía tan densa que me veía obligado a seguirlo de cerca. La calle era angosta y larga y la caminata duró casi una hora, durante la cual los viandantes fueron disminuyendo hasta reducirse al número que habitualmente puede verse a mediodía en Broadway, cerca del parque (pues tanta es la diferencia entre una muchedumbre londinense y la de la ciudad norteamericana más populosa). Un nuevo cambio de dirección nos llevó a una plaza brillantemente iluminada y rebosante de vida. El desconocido recobró al punto su actitud primitiva. Dejó caer el mentón sobre el pecho, mientras sus ojos giraban extrañamente bajo el entrecejo fruncido, mirando en todas direcciones hacia los que le rodeaban. Se abría camino con firmeza y perseverancia(8). Me sorprendió, sin embargo, advertir que, luego de completar la vuelta a la plaza, volvía sobre sus pasos. Y mucho más me asombró verlo repetir varias veces el mismo camino, en una de cuyas ocasiones estuvo a punto de descubrirme cuando se volvió bruscamente.
(8) chama a atenção essa parte: andar com firmeza e perseverança quando está rodeado de muita gente...


Otra hora transcurrió en esta forma, al fin de la cual los transeúntes habían disminuído sensiblemente. Seguía lloviendo con fuerza, hacía fresco y la gente se retiraba a sus casas. Con un gesto de impaciencia el errabundo entró en una calle lateral comparativamente desierta. Durante cerca de un cuarto de milla anduvo por ella con una agilidad que jamás hubiera soñado en una persona de tanta edad, y me obligó a gastar mis fuerzas para poder seguirlo. En pocos minutos llegamos a una feria muy grande y concurrida, cuya disposición parecía ser familiar al desconocido. Inmediatamente recobró su actitud anterior, mientras se abría paso a un lado y otro, sin propósito alguno, mezclado con la muchedumbre de compradores y vendedores (9).
(9) quando estava sozinho, apressava o passo até se encontrar em meio à multidão, quando então retomava o passo lento e se tranquilizava.


Durante la hora y media aproximadamente que pasamos en el lugar debí obrar con suma cautela para mantenerme cerca sin ser descubierto. Afortunadamente llevaba chanclos que me permitían andar sin hacer el menor ruido. En ningún momento notó el viejo que lo espiaba. Entró de tienda en tienda, sin informarse de nada, sin decir palabra y mirando las mercancías con ojos ausentes y extraviados. A esta altura me sentía lleno de asombro ante su conducta, y estaba resuelto a no perderle pisada hasta satisfacer mi curiosidad.


Un reloj dio sonoramente las once, y los concurrentes empezaron a abandonar la feria. Al cerrar un postigo, uno de los tenderos empujó al viejo, e instantáneamente vi que corría por su cuerpo un estremecimiento. Lanzóse a la calle, mirando ansiosamente en todas direcciones, y corrió con increíble velocidad por varias callejuelas sinuosas y abandonadas, hasta volver a salir a la gran avenida de donde habíamos partido, la calle del hotel D... Pero el aspecto del lugar había cambiado. Las luces de gas brillaban todavía, mas la lluvia redoblaba su fuerza y sólo alcanzaban a verse contadas personas. El desconocido palideció. Con aire apesadumbrado anduvo algunos pasos por la avenida antes tan populosa, y luego, con un profundo suspiro, giró en dirección al río y, sumergiéndose en una complicada serie de atajos y callejas, llegó finalmente ante uno de los más grandes teatros de la ciudad. Ya cerraban sus puertas y la multitud salía a la calle. Vi que el viejo jadeaba como si buscara aire fresco en el momento en que se lanzaba a la multitud, pero me pareció que el intenso tormento que antes mostraba su rostro se había calmado un tanto. Otra vez cayó su cabeza sobre el pecho; estaba tal como lo había visto al comienzo. Noté que seguía el camino que tomaba el grueso del público, pero me era imposible comprender lo misterioso de sus acciones(10).
(10) novamente percebemos o desespero do velho quando está fora da multidão.


Mientras andábamos los grupos se hicieron menos compactos y la inquietud y vacilación del viejo volvieron a manifestarse. Durante un rato siguió de cerca a una ruidosa banda formada por diez o doce personas; pero poco a poco sus integrantes se fueron separando, hasta que sólo tres de ellos quedaron juntos en una calleja angosta y sombría, casi desierta. El desconocido se detuvo y por un momento pareció perdido en sus pensamientos; luego, lleno de agitación, siguió rápidamente una ruta que nos llevó a los límites de la ciudad y a zonas muy diferentes de las que habíamos atravesado hasta entonces. Era el barrio más ruidoso de Londres, donde cada cosa ostentaba los peores estigmas de la pobreza y del crimen. A la débil luz de uno de los escasos faroles se veían altos, antiguos y carcomidos edificios de madera, peligrosamente inclinados de manera tan rara y caprichosa que apenas sí podía discernirse entre ellos algo así como un pasaje. Las piedras del pavimento estaban sembradas al azar, arrancadas de sus lechos por la cizaña. La más horrible inmundicia se acumulaba en las cunetas. Toda la atmósfera estaba bañada en desolación. Sin embargo, a medida que avanzábamos los sonidos de la vida humana crecían gradualmente y al final nos encontramos entre grupos del más vil populacho de Londres, que se paseaban tambaleantes de un lado a otro. Otra vez pareció reanimarse el viejo, como una lámpara cuyo aceite está a punto de extinguirse. Otra vez echó a andar con elásticos pasos. Doblamos bruscamente en una esquina, nos envolvió una luz brillante y nos vimos frente a uno de los enormes templos suburbanos de la Intemperancia, uno de los palacios del demonio Ginebra.


Faltaba ya poco para el amanecer, pero gran cantidad de miserables borrachos entraban y salían todavía por la ostentosa puerta. Con un sofocado grito de alegría el viejo se abrió paso hasta el interior, adoptó al punto su actitud primitiva y anduvo de un lado a otro entre la multitud, sin motivo aparente. No llevaba mucho tiempo así, cuando un súbito movimiento general hacia la puerta reveló que la casa estaba a punto de ser cerrada. Algo aún más intenso que la desesperación se pintó entonces en las facciones del extraño ser a quien venía observando con tanta pertinacia. No vaciló, sin embargo, en su carrera, sino que con una energía de maniaco volvió sobre sus pasos hasta el corazón de la enorme Londres. Corrió rápidamente y durante largo tiempo, mientras yo lo seguía, en el colmo del asombro, resuelto a no abandonar algo que me interesaba más que cualquier otra cosa. Salió el sol mientras seguíamos andando y, cuando llegamos de nuevo a ese punto donde se concentra la actividad comercial de la populosa ciudad, a la calle del hotel D..., la vimos casi tan llena de gente y de actividad como la tarde anterior. Y aquí, largamente, entre la confusión que crecía por momentos, me obstiné en mi persecución del extranjero. Pero, como siempre, andando de un lado a otro, y durante todo el día no se alejó del torbellino de aquella calle. Y cuando llegaron las sombras de la segunda noche, y yo me sentía cansado a morir, enfrenté al errabundo y me detuve, mirándolo fijamente en la cara. Sin reparar en mí, reanudó su solemne paseo, mientras yo, cesando de perseguirlo, me quedaba sumido en su contemplación.


-Este viejo -dije por fin-representa el arquetipo y el genio del profundo crimen. Se niega a estar solo. Es el hombre de la multitud. Sería vano seguirlo, pues nada más aprenderé sobre él y sus acciones. El peor corazón del mundo es un libro más repelente que el Hortulus Animae(11), y quizá sea una de las grandes mercedes de Dios el que er lässt sich nicht lesen.
(11) vale das almas


FIN


Fontes dos textos digitados, usados para minha leitura:
http://es.wikipedia.org/wiki/El_hombre_de_la_multitud


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