terça-feira, 30 de agosto de 2011

Don Quijote de La Mancha - Leituras (2)


Ilustração de Gustave Doré.

"PRIMERA PARTE


DEL INGENIOSO HIDALGO DON QUIJOTE DE LA MANCHA


CAPÍTULO PRIMERO


Que trata de la condición y ejercicio del famoso y valiente hidalgo don Quijote de la Mancha


En un lugar de la Mancha, de cuyo nombre no quiero acordarme, no ha mucho tiempo que vivía un hidalgo de los de lanza en astillero, adarga antigua, rocín flaco y galgo corredor. Una olla de algo más vaca que carnero, salpicón las más noches, duelos y quebrantos los sábados, lantejas los viernes, algún palomino de añadidura los domingos, consumían las tres partes de su hacienda. El resto de ella concluían sayo de velarte, calzas de velludo para las fiestas, con sus pantuflos de lo mismo, y los días de entresemana se honraba con su vellorí de lo más fino. Tenía en su casa una ama que pasaba de los cuarenta y una sobrina que no llegaba a los veinte, y un mozo de campo y plaza que así ensillaba el rocín como tomaba la podadera. Frisaba la edad de nuestro hidalgo con los cincuenta años. Era de complexión recia, seco de carnes, enjuto de rostro, gran madrugador y amigo de la caza. Quieren decir que tenía el sobrenombre de "Quijada", o "Quesada", que en esto hay alguna diferencia en los autores que de este caso escriben, aunque por conjeturas verisímiles se deja entender que se llamaba "Quijana". Pero esto importa poco a nuestro cuento: basta que en la narración de él no se salga un punto de la verdad..."


Assim começa uma das histórias mais famosas da literatura mundial.


Nosso herói era um ancião para aquela época. De uma hora para outra, largou todos os seus afazeres e começou a ler livros de cavalarias. Vendeu vários hectares de suas terras para comprar livros e mais livros de cavalarias.


Fazia altos debates com o padre local e com o barbeiro mestre Nicolás sobre qual cavaleiro andante dos romances era o melhor. Enfim, de tanto varar noites e dias sem dormir lendo as aventuras... lhe secou o cérebro!



En resolución, él se enfrascó tanto en su lectura, que se le pasaban las noches leyendo de claro en claro, y los días de turbio en turbio; y así, del poco dormir y del mucho leer, se le secó el celebro de manera que vino a perder el juicio.



(...)


En efecto, rematado ya su juicio, vino a dar en el más extraño pensamiento que jamás dio loco en el mundo, y fue que le pareció convenible y necesario, así para el aumento de su honra como para el servicio de su república, hacerse caballero andante y irse por todo el mundo con sus armas y caballo a buscar las aventuras y a ejercitarse en todo aquello que él había leído que los caballeros andantes se ejercitaban, deshaciendo todo género de agravio y poniéndose en ocasiones y peligros donde, acabándolos, cobrase eterno nombre y fama. Imaginábase el pobre ya coronado por el valor de su brazo, por lo menos del imperio de trapisonda, y así, con estos tan agradables pensamientos, llevado del estraño gusto que en ellos sentía, se dio priesa a poner en efecto lo que deseaba...


Eu já comentei sobre os objetivos da obra já explicados no prólogo - criticar com muita ironia os absurdos dos romances de cavalaria - e que ao longo dos séculos foi-se deixando de lado os objetivos primevos da obra para se fazer novas leituras românticas e idealistas.


É verdade que nosso cavaleiro e seu fiel escudeiro são tão envolventes que ninguém consegue ficar imune a eles e criar uma empatia que se transforma em carinho e torcida pelo sucesso de suas aventuras.


A sabedoria de Sancho Pança, então, nem se fale! Ele é demais.


Se posso dizer algo aos leitores e leitoras desse blog é que vocês só têm a ganhar em ler diariamente, um pouquinho que seja, as leituras clássicas de mestres como Machado de Assis e Miguel de Cervantes. Leiam diariamente, só nos faz bem.



Bibliografia:


CERVANTES, Miguel de. Don Quijote de La Mancha. Edición del IV Centenario. Real Academia Española y Asociación de Academias de La Lengua Española. Alfaguara 2005.


segunda-feira, 29 de agosto de 2011

ESAÚ E JACÓ - a poética do Conselheiro Aires

Aqui apresento um capítulo curto e interessante sobre o fazer narrativo do "autor" de Esaú e Jacó - o falecido Conselheiro Aires.

CAPÍTULO V


HÁ CONTRADIÇÕES EXPLICÁVEIS

Não me peças a causa de tanto encolhimento no anúncio e na missa, e tanta publicidade na carruagem, lacaio e libré. Há contradições explicáveis. Um bom autor, que inventasse a sua história, ou prezasse a lógica aparente dos acontecimentos (1), levaria o casal Santos a pé ou em caleça de praça ou de aluguel; mas eu, amigo, eu sei como as cousas se passaram, e refiro-as tais quais (2). Quando muito, explico-as, com a condição de que tal costume não pegue. Explicações comem tempo e papel, demoram a ação e acabam por enfadar (3). O melhor é ler com atenção.

Quanto à contradição de que se trata aqui, é de ver que naquele recanto de um larguinho modesto, nenhum conhecido daria com eles, ao passo que eles gozariam o assombro local; tal foi a reflexão de Santos, se se pode dar semelhante nome a um movimento interior que leva a gente a fazer antes uma cousa que outra (4). Resta a missa; a missa em si mesma bastava que fosse sabida no céu e em Maricá. Propriamente vestiram-se para o céu. O luxo do casal temperava a pobreza da oração; era uma espécie de homenagem ao finado. Se a alma de João de Melo os visse de cima, alegrar-se-ia do apuro em que eles foram rezar por um pobre escrivão. Não sou eu que o digo; Santos é que o pensou (5).

BREVES COMENTÁRIOS

As partes que destaquei são aquelas em que podemos observar características do fazer literário.

O narrador da história é bem complexo. Ele tanto se coloca como personagem interno na história porque ela se trata de escritos próprios do Conselheiro Aires, já falecido e que foi conhecido do casal, como também se coloca como narrador em terceira pessoa onisciente ao estilo demiurgo que tudo sabe, pois ele entra na mente dos personagens.

Não esqueçamos porém que o autor é Machado de Assis, que de forma fantástica criou e narrou a grande maioria de seus romances e contos através de "autores" internos que não o comprometeriam na vida real de seu mundo escravocrata, católico, branco, patriarcal e patrimonialista.

(1) O narrador da história está aqui falando da verossimilhança, uma das principais ferramentas para que uma história tenha sucesso - em se tratando de trama que busca reproduzir um fato "real" ou "possível no mundo real".

(2) Aqui o narrador reafirma que ele é personagem da história, então estaríamos falando de discurso direto. Depois veremos que há choques de estilos, porque no discurso direto não é possível afirmar o que os personagens estão pensando. Poderia supor, mas não afirmar.

(3) Muito interessante a afirmação do narrador, porque de fato uma das técnicas para acelerar ou retardar a velocidade interna do romance é ter mais ou menos descrição, reflexão, digressão etc. Essa técnica faz que passemos várias páginas parados no "tempo interno" da história. Muita vez, ocorre o contrário: aceleramos anos em poucas páginas no tempo interno da história.

(4) e (5) Aqui vemos características de autor demiurgo do discurso indireto livre. Um personagem interno de uma trama não poderia afirmar o que outros estão pensando. Mas o Conselheiro Aires é contundente ao dizer que foi Santos que "pensou".

MINHA INTERPRETAÇÃO AO SABOR DA LEITURA

Eu ainda não conheço o fim deste romance. Pode ser que ao final da leitura encontre as explicações para as misturas de discurso direto com discurso indireto livre. Sem estresse! É ler "com atenção" como sugere o narrador e curtir cada capítulo.


Bibliografia:
ASSIS, Machado de. Esaú e Jacó. In: Obras Completas. Editora Globo, 1997.

sábado, 27 de agosto de 2011

Vídeo da Romaria 2011 - Uberlândia a Água Suja (MG)


Consegui fazer um vídeo de minha caminhada deste ano de Uberlândia até a cidade de Romaria (Água Suja) em Minas Gerais.

Fiz uma caminhada de uns 75 quilômetros em 20 horas e não tive nenhuma bolha. Correu tudo bem e voltei com minhas energias renovadas.

Há muito tempo não pegava uma lua cheia tão maravilhosa e a estrada e acostamento tão bem conservados.

É isso.

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Don Quijote de La Mancha - Leituras (prólogo)


D. Quixote e Sancho Pança 
(ilustração de Gustave Doré)

"Desocupado lector: sin juramento me podrás creer que quisiera que este libro, como hijo del entendimiento, fuera el más hermoso, el más gallardo y más discreto que pudiera imaginarse..." (Prólogo)


Faço parte da pequena porcentagem de pessoas no mundo que leu os dois tomos da famosa obra de Cervantes - dom Quixote. Um dos personagens mais (des)conhecidos da história literária mundial e um dos livros famosos menos lidos também. Mas é assim mesmo! A leitura é um ato de leituras individuais que viram leituras coletivas que viram mitos que perpassam os tempos. A leitura é um diálogo eterno entre o leitor de hoje e os leitores de ontem.


Outro dia, li em uma revista alguém dizer que o dom Quixote poderia ser usado como livro de autoajuda. Eu não gosto e não uso livro de autoajuda. Mas ler dom Quixote nos ajuda a pensar o mundo e pensar o homem em seu tempo. É engraçado, pois o livro foi feito para criticar uma certa literatura da época - os livros de cavalarias - e depois foi tendo leituras cada vez mais distantes do objetivo real e os personagens foram ganhando auras fantásticas e românticas.



"Cuanto más que, si bien caigo en la cuenta, este vuestro libro no tiene necesidad de ninguna cosa de aquellas que vos decís que le falta, porque todo él es una invectiva contra los libros de caballerías..." (Prólogo)



Na minha opinião, Cervantes foi um gênio e até hoje sua vida e trajetória é cercada de mistérios e desconhecimentos, principalmente sobre sua formação.



"Y pues esta vuestra escritura no mira a más que a deshacer la autoridad y cabida que en el mundo y en el vulgo tienen los libros de caballerías..." (Prólogo)



O que eu posso dizer de quando li os dois volumes da obra, entre novembro de 2005 e janeiro de 2006, é que ri, chorei, me peguei cismando sobre tanta coisa, que nada mais é preciso dizer para despertar o interesse dos amantes da leitura para que peguem e leiam as façanhas e desventuras do hábil e inventivo cavaleiro manchego e seu fiel escudeiro.



"En efecto, llevad la mira puesta a derribar la máquina mal fundada de estos caballerescos libros, aborrecidos de tantos y alabados de muchos más; que, si esto alcanzásedes, no habríades alcanzado poco..." (Prólogo)



Sigamos lendo e relendo (quando nos damos o direito) e caminhando pelos caminhos e não-caminhos...



Bibliografia:


CERVANTES, Miguel de. Don Quijote de La Mancha. Edición del IV Centenario. Real Academia Española y Asociación de Academias de La Lengua Española. Alfaguara 2005.


domingo, 21 de agosto de 2011

Romaria 2011 - Uberlândia a Água Suja (MG)


"Caminante, no hay camino. Se hace camino al andar" (António Machado)
Minha querida mãezinha Dirce.
Cheguei a Uberlândia MG na quinta-feira 11, a casa de meus queridos pais, para me preparar para a caminhada de uns 75 km até a cidade de Romaria ou Água Suja, no Triângulo Mineiro.
Como ocorre todos os anos, estava bem ansioso para pegar a estrada e cismar sobre várias coisas durante um dia todo enquanto caminhava e recalibrava meus limites físicos e psicológicos.
Preparação para a 
longa caminhada.
Uma das etapas fundamentais antes de sair para caminhadas de dezenas de quilômetros é preparar os pés e acertar o calçado e meia. Neste ano usei o mesmo tênis do ano anterior, pois ele é muito leve, macio e com bom encaixe no formato de meu pé. Um dos segredos mais importantes é preparar os pés com ataduras ou esparadrapos onde você já prevê a ocorrência de bolhas.

Neste ano, saí para a Romaria cerca de 3 horas da tarde de sexta-feira, dia 12. Calculei que andaria umas 20 horas, ou seja, umas 12 noturnas e umas 8 com sol, e que o melhor seria pegar o sol mais fraco, depois das 3 da tarde, e na manhã seguinte, até umas 11 horas.
Sabiam que a mamona 
tem florzinhas vermelhas?
Ipês amarelos 
embelezaram-me o caminho
Mais uma vez, fui sozinho, apesar de haver muita gente na estrada de fora a fora. A paisagem tem belas surpresas como ipês, pássaros vários, cerrado retorcido, misto de verde e marrom. Flores no meio do nada.
Descida para o rio Araguari 
sob o luar que inicia.

Há muitos anos não havia uma lua tão clara como desta vez em que peguei a lua cheia em seu primeiro dia. A noite toda, das 6 da tarde às 6 da manhã, foi como uma tarde. Também foi a primeira vez que a estrada e o acostamento estavam bons – um tapete. Com a lua, reluziam. Não precisei tirar a lanterna da mochila.


Na barraca da Antena, 
3h da manhã.
Havia muitas barracas de ajuda aos romeiros. Acho até que aceitei coisas demais pra comer e a mistura me enjoou o estômago na madrugada.
Andei 75 km em 20 horas e meus pés nunca chegaram tão inteiros após uma romaria. Até agora estou impressionado quando olho para eles. Não têm um vermelhinho de carne amassada. Não têm nada! Eu preciso passar minha técnica para os caminhantes e romeiros, pois o que mais atrapalha um caminhante são as bolhas e os problemas nos pés.
Repito: o que aprendi com a barraca do exército, uns 4 anos atrás, foi que devemos colocar esparadrapos nos locais onde sabemos que aparecem bolhas como os calcanhares e as laterais dos pés, assim como nas plantas dos pés, que cozinham com o calor do asfalto. Acho que, com o passar dos anos, nós também aprendemos a pisar melhor – pelo menos aqueles que são atentos a si mesmos.


Luar sobre o rio Araguari, 18:20h
Até as 3 da manhã, caminhei com muita facilidade. Depois desse horário, bateu um sono terrível e eu penei bastante até umas 7 horas da manhã. Mesmo ouvindo boa música para não ter sonolência (rock), me deu muito frio no fim da madrugada e não conseguia comer nada. Precisei deitar meia hora em uma barraca.


E então... amanheceu!
Nessa fase da caminhada, depois de uns 40 km, é que começamos a buscar energia e superação. É preciso muita força de vontade pra ficar acordado, e com dor no corpo todo pra piorar, para superar o desejo de deitar em algum lugar e dormir.

E vamos seguindo caminhando, caminhando até chegar onde se deve chegar: quando se saí da cidade, se quer chegar ao rio Araguari (15km), depois se quer chegar à barraca de ajuda no fim da subida (26,5km), depois se quer chegar ao posto N. Sra. da Guia (36km), depois à barraca da Antena (47km), depois ao posto Sta. Fé (59,5km), depois ao Atalho (66km), depois à cidade e ao fim da romaria (74km).

São 9h e o Atalho marca a última fase. 
São mais 8km até a cidade.

O tempo vai passando. Se, por um lado, a nossa energia já não é mais a mesma que na juventude, por outro, aprendemos a lidar conosco melhor do que antes.

Córrego que marca a última etapa de verdade. 
Agora faltam 3km e uma subida sem fim.

Houve um momento, depois que cheguei e estava esperando um ônibus para voltar para Uberlândia, que passei mal – acho que por ficar umas 30 horas sem dormir e por falta de glicose no sangue -. Fiz um esforço tremendo para não desmaiar. Quando escureceu a vista e eu senti que ia apagar, fiz um esforço tremendo para voltar e ficar consciente. Funcionou.

O objetivo de todos: 
cada um, um motivo.
Apesar de ser uma caminhada cansativa, consegui bater algumas fotos da paisagem da estrada como vocês puderam ver neste post – sequidão e flores.
Mais um ano, mais um teste de perseverança e de renovação de energia.
Seguimos caminhando...

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Instantes

A minha caminhada correu tudo bem. Ainda não consegui postar texto, imagens e vídeo. Espero fazê-lo no próximo fim de semana.

Estou em Brasília trabalhando muito nesta semana.

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Se ateu, por que fazer romarias?


Igreja de N. Sra. da Abadia, Água Suja (MG).

Estou em Uberlândia para fazer minha romaria deste ano. Pego a estrada nesta sexta-feira 12 e pretendo chegar em meu objetivo cerca de 21 horas depois. Pretendo fazer um percurso de uns 75 km.

O que os amigos e conhecidos mais perguntam é por que faço romarias se sou ateu. É interessante poder explicar que se caminha por vários motivos. Vários.

Já me acostumei a ter certa ansiedade quando vai chegando a época de vir a Minas Gerais e pegar a estrada. É um momento de introspecção muito grande. É um momento de humildade, de perseverança e de restabelecimento de forças e energias internas.

Para mim não é esporte. Não é pagamento de promessa. Não é fé em nenhum deus. Para a grande maioria dos romeiros é tudo isso - promessa, fé, religiosidade.

É um momento de fé na capacidade de superação do ser humano, de fé em minha mente, em meu corpo, em meus objetivos.

A caminhada é muito difícil. É dolorosa, sofrida, em alguns anos mais que outros. Não tenho a mínima ideia de como será neste ano. Só sei que é muito difícil. Mas acredito que chegarei lá.


PAI E MÃE - REFERÊNCIAS DE VIDA

Hoje, saí com meu velho e querido pai de 68 anos (e pouca saúde) para acompanhá-lo em alguns dos locais onde ele busca por seus direitos - juizados gratuitos, defensoria pública etc - pois ele não desiste de lutar pelo que acha correto e justo. Meu pai tem a terceira série primária, mas é um homem que nunca deixou de buscar os seus direitos quando entende que os tem. Obrigado pai, por você ser assim.

Minha mãezinha é outra pessoa simples e forte. Sofre suas dores, cuida da mãe sem ter condições físicas, mas cuida, com tanto amor que nos deixa meio envergonhados, por sermos mais jovens e mais moles. Meus pais não conseguem sequer serem atendidos em nosso SUS com a decência que todo brasileiro mereceria.

Talvez eu caminhe para tentar buscar anualmente a força de vontade e perseverança em viver e lutar pelas coisas que amo e que acho correto. Eu sou um filho que sei que meus pais se esforçam em estar vivos porque sabem o quanto isso é importante para mim. Eles são meu vínculo mais forte com a vida.

Talvez eu caminhe para relembrar durante um dia inteiro, sozinho na estrada, vários momentos de minha longa vida já vivida em um curto espaço de tempo. Minhas alegrias passadas, minhas perdas passadas, minhas oportunidades e escolhas nas veredas da vida. Há vidas bem mais longas e bem mais curtas. A minha é a minha.

Talvez eu caminhe para me testar, física e psicologicamente, se ainda posso alguma coisa. Se ainda me aguento. Se meu corpo aguenta meus excessos. Se eu aguento sacrifícios e dificuldades. Se eu não estou lasso. Às vezes, tenho a impressão que as gerações depois da minha estão meio lassas.

"Caminante, no hay camino. Se hace camino al andar" (António Machado)

Seguimos caminhando...

William Mendes


Post Scriptum (9/08/15):

Neste dia dos pais, estou em Uberlândia com meus queridos pais. Não escrevi texto novo sobre o tema, somente disse de meu amor pessoalmente.

domingo, 7 de agosto de 2011

16a Corrida do Centro Histórico de SP

Após passar o mês de julho trabalhando como um louco e por semanas seguidas, incluindo os finais de semana, corri hoje os 9 km da Corrida do Centro Histórico.

Troféus do Sindicato - Fotos de Jailton Garcia

O clima estava muito bom. Fez sol e calor neste domingo, após dias de muito frio até a última sexta-feira em São Paulo.

Para não correr sem nenhum treino, fiz durante a semana duas corridas de 6 km cada. Apesar do cansaço acumulado do período, consegui percorrer o trecho com cuidado, em trote bem leve, e fiz em uma hora a prova.

Espaço para os corredores - Fotos Jailton Garcia

O percurso é bastante prazeroso. Passamos em alguns viadutos como o Viaduto do Chá e Viaduto Santa Ifigênia, passamos no Teatro Municipal, no Largo do São Bento, na Catedral da Sé, no Pátio do Colégio e em outras construções antigas.

Pódio dos bancários - Foto Jailton Garcia

Agora mentalizo e me preparo para a minha caminhada lá em Minas Gerais de uns 85 km, que farei na próxima sexta-feira.

Pódio das bancárias - Foto Jailton Garcia

É isso. Esporte é uma das portas de entrada para a cidadania e para os espaços coletivos como o Sindicato, a casa do trabalhador.

sábado, 6 de agosto de 2011

Leituras de economia - Alguns aspectos do conhecimento econômico


"Ler para viver" (Flaubert)
 Rossetti inicia seu livro - Introdução à Economia -, nos anos 90, falando de um binômio "perplexidade-incerteza" relativo a décadas acumuladas de problemas persistentes como, por exemplo, desnível de desenvolvimento econômico entre as nações do Norte e do Sul, tamanho da população mundial, maior atenção em questões ambientais e recursos naturais, fim do bloco soviético e queda do Muro de Berlim.

Também falava em "mudanças promissoras" lá nos anos 90, claramente se referindo à certa vitória do regime capitalista de mercado em relação ao socialista de Estado. Para isso, cita as reformas modernizadoras na China Continental a partir de 1979, cita a abertura liberalizante (glasnost) e a reestruturação econômica (perestroika) da CEI, ex-URSS e o fim da Cortina de Ferro e a queda do Muro de Berlim.

Mais adiante, num item que fala sobre o crescente interesse pela economia, tem uma citação legal de um economista dos anos 70 que diz o seguinte:

"Será que o homem desceu das árvores, aprendeu a andar e a conquistar até o núcleo do átomo, para chegar, afinal, à conclusão de que não é capaz de controlar a estabilidade dos preços?" p.32(Samuelson, Paul Anthony. Introdução à análise econômica. RJ, AGIR, 1975)


A ECONOMIA E O ENFOQUE MULTIDISCIPLINAR

A Economia e a Política: "A organização política e a organização econômica tornam-se interdependentes: a ação econômica subordina-se à estrutura política da sociedade, geralmente determinada por certo grupo de dominação, enquanto a ação do grupo de dominação política se encontra muitas vezes subordinada à estrutura dos centros de disposição do poder econômico" p.39

Outra citação conclui esta ligação: "Também em termos conjunturais, a interligação é bastante clara: em qualquer sociedade, a instabilidade econômica conduz fatalmente à instabilidade das instituições políticas. Reciprocamente, o bom desempenho econômico alinha-se entre os fatores essenciais que condicionam a estabilidade dos centros de disposição do poder político" p.40


A Economia e a Sociologia: "Em seu Cours d'Économie Politique, de 1828, Jean Baptiste Say, um dos mais notáveis teóricos da Economia na França, argumentaria que o desenvolvimento das Ciências Econômicas estaria subordinado à investigação que os economistas deveriam empreender sobre as inter-relações e a coesão existentes entre as várias partes do sistema social. Tal argumentação implicaria a redução das distâncias entre a Sociologia e a Economia" p.40

E conclui: "Os economistas contemporâneos não desconhecem que os móveis psicológicos, de natureza subjetiva, tão importantes como os fatores objetivos condicionantes da atividade econômica, são determinados por vários conjuntos de relações sociais, cuja análise interessa diretamente à Economia, embora constituam o próprio objeto da Sociologia, a ciência particular do social" p.41


A Economia e a História: "Assim, embora não se possa afirmar que a pesquisa histórica seja a principal fonte da Análise Econômica, deve-se reconhecer que a Economia é altamente auxiliada pela História, principalmente porque o economista precisa acompanhar, no dia-a-dia, as rápidas transformações culturais que estão marcando as civilizações do Ocidente e do Oriente. Mais que isto, como bem observa M. Niveau, 'o economista deve apoiar-se na História, não somente para nela descobrir o passado, mas também para melhor compreender o presente e antecipar o futuro" p.42


A Economia e a Geografia: "Devido às vocações naturais e á diversidade tipológica dos recursos das várias regiões, são relativamente poucos, em relação ao conjunto da fenomenologia econômica, os fenômenos que não possuem características regionais, ou, mais precisamente, espaciais. O problema econômico fundamental do homem, que se traduz pela luta contra a escassez, é evidentemente o mesmo tanto nas aldeias primitivas do Sudeste Asiático quanto nas sofisticadas metrópoles da Europa Ocidental" p.43


A Economia e o Direito: poderia resumir com esta parte: "Com a substituição do franco-liberalismo pela ordem econômica orientada ou dirigida pelo setor governamental (após a Grande Depressão dos anos 30 e a Segunda Grande Guerra), ampliou-se a produção legislativa referente às atividades econômicas. E isto fez com que o conhecimento econômico e o conhecimento jurídico abandonassem as velhas concepções que os mantinham afastados, para então estreitarem as relações de interdependência que atualmente os caracterizam" p.44

COMENTÁRIO:
É LÓGICO QUE, APÓS O LIVRO AFIRMAR ISSO (MAIOR REGULAÇÃO DO ESTADO DE 30 A 80), NO INÍCIO DOS ANOS 90 NÓS TERÍAMOS UM APROFUNDAMENTO DAS DESREGULAMENTAÇÕES DO ESTADO EM RELAÇÃO À ECONOMIA E À CIRANDA FINANCEIRA COM BUSH PAI, BILL CLINTON, BUSH FILHO, O NEOLIBERALISMO PÓS-COLLOR E FHC NO BRASIL ETC. ESSA TRAGÉDIA TODA FOI MONTADA NOS ANOS 90 E 2000 E ESTOUROU EM CRISE MUNDIAL EM 2008 E HÁ PREVISÕES DE QUE A CRISE VINDOURA SERÁ MUITO MAIOR E COM CONSEQUÊNCIAS TERRÍVEIS PARA O PLANETA.


It's the economy, stupid!

O autor conclui o capítulo assim:

"Em síntese, pode-se inferir que as interfaces da economia com outros ramos das ciências sociais decorrem de que as relações humanas e os problemas nelas implícitos ou delas decorrentes não são facilmente separáveis segundo níveis de referência rigorosamente pré-classificados. O referencial econômico deve ser visto apenas como uma abstração útil, para que se analisem aspectos específicos da luta humana pela sobrevivência, prosperidade, bem-estar individual e bem-comum. Ocorre, todavia, que essa mesma luta não se esgota no nível do que se convencionou chamar de relações econômicas. Vai muito além, abrangendo aspectos que dizem respeito à postura ético-religiosa, às formas de organização política, aos modos de relacionamento social, à estruturação da ordem jurídica, aos padrões das conquistas tecnológicas, às limitações impostas pelas condições do meio ambiente e, mais abrangentemente, à formação cultural da sociedade"

Bibliografia:
ROSSETTI, José Paschoal. Introdução à Economia. 16a edição, Editora Atlas SA, 1994.

Economia e economistas "explicam" porque países do sul são pobres... (anos 90)

Relendo um pouco de economia, achei interessante o livro do professor Rossetti explicando no início dos anos 90 os interesses crescentes de várias áreas de estudo pela economia.

Em certa altura, o livro comenta o absurdo das diferenças entre o Produto Nacional Bruto per capita de regiões do Norte e do Sul que chegam a 30 vezes. E chega a 50 vezes quando se compara países.

"É acentuada, entre os países, a diversidade dos níveis de desenvolvimento e de padrões de vida. Medidos, por exemplo, por um indicador-síntese, como o Produto Nacional Bruto per capita, as diferenças entre as áreas economicamente mais adiantadas e as mais deprimidas chegam a atingir fatores superiores a 30: o PNB per capita dos países da África, da América Central e da América do Sul, tomado em conjunto, é trinta vezes menor que o PNB per capita dos países mais desenvolvidos da Europa Ocidental. Ao nível de países, o fator de distanciamento eleva-se a 50." pág. 35

No parágrafo seguinte é interessante a explicação das múltiplas causas do problema de diferença tão grande de desenvolvimento econômico:

"Esta diversidade não pode ser atribuída a uma causa isolada. Suas causas são múltiplas, envolvendo questões de geografia e clima, raça e costumes, religião e crenças sociais, qualidade da força de trabalho e formação histórica dos recursos de capital (*)...

* Que forma mais parcial de dizer uma coisa sem citar o problema real e não se queimar com os capitalistas e classe dominante. Faltou dizer que a principal causa É A EXPLORAÇÃO COLONIAL HISTÓRICA AOS PAÍSES DO SUL. ISTO É ÓBVIO!

(...) E seus efeitos são também múltiplos, não se encontrando entre as nações economicamente deprimidas uma única e homogênea atitude em relação à mudança. Tanto se encontram culturas que aceitam fatalisticamente a pobreza como regiões em que a obstinada perseguição do bem-estar tem conduzido à formação de tensões sociais e políticas nem sempre facilmente controláveis." (**)

** Esta parte então é ótima, que confessa que a exploração (por parte dos "desenvolvidos" e seus lacaios burgueses locais) tem levado a níveis de miséria humana insuportáveis que não está mais sendo possível controlar as tensões!!!


PUDEMOS VER O RESULTADO DESSA PREVISÃO DO ECONOMISTA (nos anos 90) SOBRE DIFICULDADES DE CONTROLAR AS TENSÕES DOS POVOS EXPLORADOS: NA AMÉRICA LATINA, NA DÉCADA DE 2000, A GRANDE MAIORIA DOS PAÍSES ELEGEU GOVERNOS MAIS PROGRESSISTAS E COM PROGRAMAS CONTRÁRIOS AO NEOLIBERALISMO.


Bibliografia:
ROSSETTI, José Paschoal. Introdução à Economia. 16a edição, Editora Atlas SA, 1994.

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Refeição Cultural 76 - Sentimentos

(atualizado às 22:56h)

O que ando digerindo em meio a tanta correria e falta de tempo para o ócio criativo? Algumas coisas que vejo, ouço, sinto e martelam dentro de mim.

Impressões de que os tempos vindouros serão difíceis. E que preciso recuperar meu fôlego e energia para suportá-los e quiça conduzir o movimento social e achar soluções, mesmo que sejam em meio à confusão.

Minha condição física não está em seu ideal, mas vou daqui a alguns dias correr a prova do Centro Histórico de São Paulo no domingo 7, corrida de 9 km, e na semana seguinte, no dia 12, vou fazer a minha caminhada anual de uns 80 km lá em Minas Gerais. Tenho muitos receios e incertezas para deglutir andando...

O excesso de trabalho e de responsabilidade assumida por mim mesmo deixou-me bem quebrado nos últimos meses de militância.

Todos nós vivemos mesclando sonhos, realidades, lembranças e desejos. Tenho sonhos. Vivo realidades e luto para mudá-las. Tenho lembranças e desejos.

Acho que nossa vida é amarrada nisso: utopias futuras e lembranças de realidades passadas.

Alguns filmes como Uma história real e Wall-E poderiam exprimir um pouco do que sinto por estes tempos: este, em relação ao mundo que me cerca e por onde parece que vai; aquele, ao meu mundo de ontem e aos meus sonhos mais cândidos.

Sei que tenho que ler muito sobre o movimento sindical, sobre economia, sobre o Banco do Brasil, sobre política, sobre formação. Está difícil conciliar o meu desejo de AÇÃO com o meu desejo de CRIAÇÃO. Na posição em que estou no movimento sindical sou cobrado como secretário de formação da executiva da Contraf-CUT e liderança nacional do Banco do Brasil. Ao mesmo tempo, não consigo deixar de ir para o dia a dia sindical onde contato os bancários.

Mas essa tentativa de conciliar meu papel na Confederação com meu desejo de contato com os locais de trabalho está me quebrando fisicamente. Dureza!

Preciso focar muito para produzir melhor para o movimento sindical.

E COM TUDO ISSO, tem ficado em segundo plano minha pessoalidade. E os problemas de ser humano que carrego comigo...

... seguimos na luta.