domingo, 23 de março de 2008

A Paixão de Cristo - Mel Gibson (2004)


Foto divulgação

(Atualizado em 20/12/19, às 9h20)

Refeição Cultural

Direção: Mel Gibson - 2004

Impressões...

Após assistir ao filme A Paixão de Cristo, dirigido por Mel Gibson, vi-me impelido a fazer alguns comentários sobre ele.

Vê-se claramente que o filme quer atingir o seu público pela catarse imagética. Os diálogos que existem são tão poucos e tão inexpressivos que quase não se fazem necessários.

Em primeiro lugar, quero deixar já a minha opinião sobre o que achei da obra: grotesca!

Como humanista, saí do cinema com um grande aperto no coração. Doía mesmo! De tanta repulsa que senti ao ver tanto sangue. Já vi filmes que me chocaram bastante pela tortura a seres humanos. Mas como esse, ainda não consegui me lembrar de nenhum.

Gostaria de saber, de fato, qual a intenção do diretor, em escolher um banho de sangue e sangue e sangue para fazer um filme retratando um homem que viveu acerca de dois mil anos e que pregou a paz, a não violência, o amor para com todos, a esperança em um reino metafísico e na existência de um ser superior e que segundo Suas palavras, criou a tudo e a todos.

Confesso que não percebi nada da tal polêmica de que o filme pregaria o ódio aos judeus. Também achei infantis aquelas bestas “óliudianas” que apareciam para Judas e Jesus.

É interessante observar que o diretor conseguiu fazer um filme que não passa nenhuma mensagem pregada pela personagem retratada: Jesus Cristo. Perdeu a oportunidade de colocar diálogos importantes entre Este e os apóstolos, entre Ele e seu Pai, só para ficar nas passagens mais conhecidas dos evangelhos.

Muitos filmes sobre Cristo já foram feitos, daqueles antigos “café com leite” e foram muito melhores do que este.

E, para não falar que a questão de considerar o filme tão ruim é de ordem dogmática, vale salientar que se o objetivo do diretor era questionar a tradição cristã retratando Jesus de forma diferente daquela pregada pela igreja e por seus seguidores, muitos diretores já fizeram obras melhores que chocaram também o público, principalmente os cristãos, mas com qualidade superior no roteiro e na linha ideológica contrastante como, por exemplo, “A última tentação de Cristo” (1988), de Martin Scorsese, que, por sinal, também não gostei.

A única coisa que penso que se possa aproveitar da catarse sanguinolenta proporcionada pelo filme é a oportunidade de chamar a atenção para o cuidado que se deve ter ao lidar com massas e multidões. Lidar tanto com grupos excluídos, necessitados e subjugados, quanto com grupos de dominadores, vencedores e mais organizados socialmente requer clareza do que se busca e onde se quer chegar.

É importante conhecer sempre a tênue linha que separa a fraternidade da barbárie. Assim como os homens do Sinédrio levaram uma massa a pedir a troca e crucificação de um bandido condenado por um inocente, pode-se ver atualmente populações festejarem americanos queimados e pendurados no Iraque, bandidos em um presídio felizes a jogarem pedaços de presos pelo telhado, soldados nazistas exterminando milhares de judeus em fornos, crianças e adolescentes arrebentando uns aos outros com camisas de clubes rivais e daí por diante.

Sempre penso que devemos ter muita atenção ao que dizemos e em nossos atos, seja para com nossos filhos, amigos ou para com nossos adversários, por mais que, muitas vezes, estejamos “putos da vida” com eles.

É possível mudarmos sempre, tanto para melhor, quanto para pior (socialmente falando). Depende muito do contexto em que estamos. É pena não poder hoje desejar que o humano seja mais Humano, porque nestes dias que correm, as pessoas valem pelo que compram e têm, e não pelo que são...

Mas muitos de nós trabalhamos para mudar isso, é ou não é?


(Escrevi estas impressões em 2004, após o lançamento)

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Post Scriptum (31/3/18):

Assisti novamente ao filme. Já se passaram quatorze anos desde que vi o filme pela primeira vez. Tanta coisa mudou: eu, meu mundo, o mundo. Sigo achando a violência extremada, um exagero. Mas ela é bem o retrato da maldade humana. É muito real. Somos maus mesmo! 

Uma coisa eu mudei de opinião em relação ao texto original que escrevi: entendo que o filme incita, no mínimo, muita raiva em relação ao povo judeu, pela forma como ele foi mau com o cidadão Jesus Cristo. É isso!

Post Scriptum (20/12/19):

Revi o filme e se já havia mudanças importantes em março em 2018 como disse acima, o que poderia dizer agora, após o primeiro ano do Brasil governado pela milícia, pelo fascismo? Os fariseus do Sinédrio chegaram ao poder central, as leis são usadas para caçar e aniquilar qualquer pessoa que pense diferente deles. Assassinatos, chacinas, tiros na "cabecinha" ordenados por governantes. O símbolo dos governantes no poder são armas, cartuchos de balas, dedo indicador e polegar modelo "arminha". O ódio venceu. Jesus perdeu. E a destruição de tudo segue acelerada em Seu nome.

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